5º Simpósio de Missiologia: “Quero uma Igreja missionária, testemunha da misericórdia”

de Jaime Patias – 17/03/2016

O tema foi abordado, nesta terça-feira, 15, pelo professor Sérgio Coutinho, doutor em História da Igreja. Em sua reflexão o professor destacou os princípios eclesiológicos para uma Igreja em saída, os desafios encontrados neste processo e as “cristalizações que impedem, de certa maneira, uma eclesiologia de uma Igreja em saída missionária”.

Coutinho recorreu a um discurso do papa Francisco, de 17 de outubro de 2015, dia em que se comemorava os 50 anos do Sínodo dos Bispos. O papa discursou na Sala Paulo VI, durante uma pausa do Sínodo da Família. “Eu considero esse discurso muito importante e acho que ainda não foi absorvido. Recentemente um grupo de cardeais, que é uma espécie de conselho do papa, colocou esse texto para ser debatido. Isso revela a importância dessa fala do papa Francisco”, comentou.

O professor explica que o centro do discurso do papa Francisco está baseado numa expressão de São João Crisóstomo, padre da Igreja, do primeiro milênio, onde ele fala que Igreja e Sínodo são sinônimos. “Todo o discurso do papa Francisco é em torno de uma Igreja sinodal, da prática da sinodalidade. E para esclarecer isso o santo padre desenvolve a fala em três níveis, uma interpretação trinitária, citando três níveis de autoridade: comunitário, colegial e nível da presidência”, explicou.

Sérgio Coutinho esclarece que o papa Francisco organiza os três níveis da Igreja sinodal da seguinte forma: “Ele começa com o povo de Deus, ou seja, o nível comunitário, onde Francisco fala da infalibilidade do povo de Deus. Nesse sentido, unido pela fé, o povo de Deus não erra. Isso faz lembrar também outro elemento teológico que é o sensus fidei, o senso da fé, o consenso do povo de fé. Aqui, Francisco desenvolve a importância de se valorizar o rebanho, que também tem olfato e esse olfato também indica caminhos. Por isso que o papa, em termos de método, achou que valeria a pena fazer um sínodo em duas etapas. Sendo que na primeira etapa, antes de começar o sínodo, ele fez uma ampla consulta ao povo. Porque o povo tinha que dizer o que pensava”.

O professor destaca ainda que, “para explicar o segundo nível, o nível colegial, o papa diz que os bispos precisam não só falar, mas saber escutar. E escutar significa ouvir a voz que vem desse povo, dessa instância comunitária, desse nível base. Assim os bispos podem dar os encaminhamentos, dar as direções que precisam ser feitas na caminhada da Igreja”.

No nível da presidência, o papa Francisco se inclui, é o nível do bispo de Roma. Coutinho explica que o santo padre trabalha toda a noção de comunhão, de comunhão hierárquica. “Nesse nível, disse o papa, deve haver uma comunhão com Pedro e também estar sob Pedro. Francisco usa a expressão cum Petro et sub Petro. Com Pedro, em diálogo, em comunhão, mas também, de alguma maneira hierarquicamente. Neste ponto Francisco mostra que a hierarquia, comunhão hierárquica, é vista por meio da ideia de ministro, de ministério. A própria palavra quer dizer ‘aquele que se faz menor’. Sendo assim, aquele que está à frente, com o cargo de direção tem que se fazer o menor de todos para servir melhor. O papa fala do nível da presidência a partir da ideia de serviço”.

Nessa estrutura tríade, trinitária, o papa Francisco lança a proposta de uma Igreja que seja toda sinodal, que leve em conta essa prática da sinodalidade. Sérgio Coutinho esclarece que “essa prática tem consequências ecumênicas porque se aproxima com outras igrejas, no sentido de descentralização. Também tem uma dimensão política porque a Igreja católica pode ser um sinal para a sociedade como um todo. No momento em que a gente vive uma crise de democracia representativa, a prática da sinodalidade pode ser um exemplo, um modelo de como nós, na Igreja, podemos viver em diálogo, buscando soluções, enfrentando as dificuldades naquela ideia de caminhar juntos. Sínodo significa isso, caminhar juntos: o povo, os pastores e o bispo de Roma. Todos essas três instâncias caminhando juntas em busca de um consenso”.

Professor Sérgio Coutinho propôs, aos participantes do Simpósio, pensar essa estrutura sinodal e como ela pode ser vivida em nosso cotidiano. “Aí a gente realmente percebe uma série de dificuldades e problemas. São limites desse princípio eclesiológico que o papa Francisco está colocando para incentivar uma Igreja em saída”.

Mesmo com tantos discursos, pronunciamentos e pregações de incentivo do papa Francisco, o professor ainda percebe uma inércia muito grande na Igreja. “Em todo movimento ainda há muitas resistências. Mesmo papa Francisco fazendo várias interpretações, agindo, os seus gestos são realmente proféticos, me parece que isso ainda não foi levado a sério”, pondera. Segundo o pesquisador as mudanças não dependem só dos presbíteros e bispos, mas também do povo.

Por isso, em suas colocações, professor Coutinho procurou valorizar essas instâncias de participação na Igreja, desde o nível mais básico, que são os conselhos comunitários de pastoral, subindo para os conselhos pastorais paroquiais, diocesanos, até as assembleias diocesanas. Coutinho avalia que sem esses espaços “o papa Francisco continuará isolado, sofrendo resistência. É preciso uma mudança de postura também na base”.

Em sua opinião, “é essa Igreja profetizada pelo papa Francisco, que a gente quer”. Mas, ao mesmo tempo, “não vê nenhuma movimentação para implementar isso. É óbvio que tem resistência nos setores mais intermediários, de alguns bispos e alguns padres que têm esse movimento de inércia ou de resistência, mas o povo precisa fazer a coisa acontecer. Não vai vir de cima pra baixo. É preciso, então, que a base faça movimentar o processo para que a mudança aconteça”.

O 5º Simpósio de Missiologia é promovido pelo Centro Cultural Missionário de Brasília (CCM) e a Rede Ecumênica Latino Americana de Missiólogos e Missiólogas (RELAMI), e reflete sobre o papa Francisco como “timoneiro da esperança”. O Evento reúne no CCM cerca de 50 pessoas entre docentes, teólogos, pesquisadores, representantes de instituições missionárias, agentes de pastoral de todo o Brasil. A programação se estende até quinta-feira, 17.

Fonte: POM