Missão e Cultura 1: Discípulos Missionários de Esperança
de Rafael López Villaseñor – 07/07/2025

O primeiro número da Revista Missão & Culturas desenvolve a temática “Discípulos missionários da esperança”, em sintonia com a realização do Ano Santo da Esperança, proclamado pelo saudoso Papa Francisco pela bula Spes non confundit (SNC) “A esperança não decepciona”, pois ela é o próprio Ressuscitado. Cristo é a esperança que não decepciona e que encoraja a comunidade cristã diante de um mundo sem horizontes. A alegria e a esperança em Cristo Ressuscitado não podem enganar, porque projetam para o futuro e fazem viver intensamente o presente, ainda que sua realização plena pertença ao futuro escatológico. A esperança não é fuga da realidade, mas uma força transformadora, enraizada na experiência pascal do Ressuscitado.
Na mensagem para o Dia Mundial das Missões de 2025, o Papa Francisco, de feliz memória, afirma que os discípulos missionários de Cristo “são os primeiros convocados a formarem-se para serem ‘artesãos’ de esperança e restauradores de uma humanidade frequentemente distraída e infeliz”. Ser “artesão de esperança” é ser agente de transformação social, moldando a realidade a partir dos valores do Reino. Essa missão começa no dia do batismo, como membros da Igreja “peregrina da esperança”, enviada em missão em nome da Trindade: “Ide, fazei discípulos de todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado” (Bíblia, Mt 28,19-20). E a Evangelii Gaudium (EG) assegura que: “Em virtude do batismo recebido, cada membro do povo de Deus tornou-se discípulo missionário” (EG 120). E cada um deve assumir referido compromisso de acordo com suas possibilidades e estado de vida. De todo modo, ninguém está isento da missão universal, pois os discípulos missionários são chamados a formar outros discípulos missionários para, como diz o Documento de Aparecida (DAp): “ir aonde a Igreja ainda não está presente” (DAp 376).
Testemunhar a esperança é sempre uma tarefa desafiadora diante da conjuntura mundial, marcada por guerras, violência e pessimismo, porque hoje não se vivem tempos de otimismo ou grandes utopias. Ser “artesão de esperança” é caminhar com os pés na realidade e, sem se render ao pessimismo, ir contra a corrente, testemunhar o Reino de Deus e anunciar que a mensagem de Jesus Cristo é de esperança e transformação para todas as realidades. A mensagem cristã deve ser vivida à luz da ressurreição de Cristo crucificado, como projeto de esperança frente às promessas de um futuro escatológico. Portanto, ser “artesão de esperança” exige profetismo e audácia, coragem para denunciar os contravalores do Reino e testemunhar os princípios de uma verdadeira sociedade humana, alicerçada nas promessas do Reino de Deus.
O Concílio Vaticano II, por meio da Constituição Pastoral Gaudium et Spes (GS), afirmou: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e esperanças, as tristezas e angústias dos discípulos de Cristo” (GS 1). Assim, a missão dos discípulos missionários é ser sinal de alegria e esperança da ressurreição, diante das angústias e dores dos mais pobres e sofredores. Em um mundo globalizado, a missão é sempre um compromisso com os mais empobrecidos por “despertar esperança em meio às situações mais difíceis, porque, se não há esperança para os pobres, não haverá para ninguém” (DAp 395). E viver sem esperança torna a vida humana insignificante, insuportável.
Realçamos que, “Cristo ressuscitado e glorioso é a fonte profunda da nossa esperança, e não nos faltará sua ajuda para cumprir a missão que nos confia” (EG 275). A Páscoa é a festa da alegria e da esperança, pois o Deus da Vida ressuscitou Jesus crucificado. A partir desse grande acontecimento, há esperança para todos os crucificados da história. Como disse o teólogo Jürgen Moltmann (2005): “A fé cristã vive da ressurreição do Cristo crucificado e se estende em direção às promessas do retorno universal e glorioso de Cristo.” Sinaliza a base escatológica do cristianismo, pois a fé cristã se alicerça na ressurreição de Jesus. Esse sentido aflora na afirmação do Papa Francisco, na bula de convocação para o Ano Jubilar, quando diz: “A esperança nasce do amor e funda-se no amor que brota do Coração de Jesus trespassado na cruz” (SNC 3).
Portanto: “Não deixemos que nos roubem a esperança!” (EG 87), pois sem ela a vida perde o sentido, o sabor, a perspectiva e a alegria. A esperança é a força e o combustível cotidiano para superar os desafios e dificuldades. “Sejamos realistas, mas sem perder a alegria, a audácia e a dedicação cheia de esperança. Não deixemos que nos roubem a força missionária!” (EG 109). A esperança é uma virtude dinâmica na vida do discípulo missionário, sendo a força, a alma e o motor a sustentar e animar a missão do discípulo missionário. Enraizada e fortalecida em Jesus Cristo, ampara a caminhada missionária e se confirma no amor ao próximo, por meio da justiça social e do cuidado da casa comum. A sabedoria popular diz que “a esperança é a última que morre”. De fato, a esperança no Deus da Vida é a única força capaz de sustentar quem enfrenta sinais de morte, dor, sofrimento e injustiça. Os discípulos missionários são sinal do Reino no meio das dores do mundo e proclamam, com gestos e propriamente por seu testemunho, que a última palavra não é o sofrimento, mas a vida nova que brota em Cristo Ressuscitado: esperança de um mundo mais justo, mais humano, prelúdio do Reino de Deus. A esperança é a força da missão, delineia projetos para o futuro e transforma a realidade presente dos pobres.
Tal propósito condiz com a mensagem para o ano jubilar, quando o Papa Francisco disse que “o Jubileu seja, para todos, ocasião de reanimar a esperança” (SNC 1).
Paulo Freire (1997), o pedagogo da esperança, usou o verbo “esperançar” como possibilidade de construir um futuro melhor, não como passividade, mas como ação concreta pela justiça social, igualdade e emancipação: “A esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é levantar-se, é ir atrás, é construir, é não desistir! Esperançar é levar adiante, é juntar-se com outros para fazer diferente.” Esperançar não é passividade, é força ativa que resiste às injustiças e motiva a luta por transformação social, justiça e paz. Não há mudança sem sonho, e não há sonho sem esperança. Trata-se de uma espera ativa, que se levanta em busca dos direitos fundamentais. É, portanto, necessário ter esperança, conjugada pelo verbo esperançar.
Essas inquietações e perspectivas pautam a Revista Missão & Culturas das Pontifícias Obras Missionárias, a qual acolhe o desafio de tentar compreender as transformações inerentes às novas realidades enfrentadas pela ação missionária e pastoral. É um instrumento para auxiliar a formação, reflexão e práticas pastorais missionárias, integrando a missão tanto “ad intra” como “ad extra”, isto é, a missão local e universal. Seu conteúdo almeja contribuir com reflexões sobre as mudanças na compreensão da teologia da missão universal, no intento de fortalecer uma “Igreja em saída de portas abertas”, preocupada com as realidades e situações humanas mais extremas, em uma sociedade marcada pela desesperança da pós-modernidade, polarizada pela intolerância, violência, xenofobia e monocultura, entre outros males que desafiam e precisam ser enfrentados. Cenário esse que precisamos compreender para despertar novos tempos para a humanidade.
Os temas abordados são uma contribuição para o avanço do conhecimento, ao estudo, ao aprofundamento e à pesquisa da teologia da missão no Brasil e na América Latina. É instrumento de incentivo à formação para a sensibilização missionária de todo o Povo de Deus, em vista da missão universal. Seu formato digital oferece, de forma gratuita e acessível a todos, conteúdo missiológico variado por meio de artigos, ensaios, resenhas e relatos missionários. Seu objetivo principal é impulsionar, desenvolver e popularizar pesquisas e contribuições missionárias, fortalecendo uma Igreja “em saída”, de “portas abertas”, em busca de novos dinamismos com o compromisso de fortalecer a missão universal da Igreja.