Simpósio debate sombras e esperanças no projeto do papa Francisco

de Jaime Patias – 17/03/2016

O pontificado do papa Francisco é tema de estudo no 5º Simpósio de Missiologia que acontece no Centro Cultural Missionário (CCM) em Brasília (DF). Promovido pela Rede Ecumênica Latino Americana de Missiologos (RELAMI) e o CCM, o evento reúne cerca de 50 teólogos, pesquisadores, representantes de instituições missionárias, agentes de pastoral de todo o Brasil.

Nesta quarta-feira, 16, os debates giraram em torno das “sombras e esperanças” no projeto do papa Francisco e foram conduzidos pelo assessor teológico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), padre Paulo Suess.

“Três anos parece um tempo muito curto para uma avaliação profunda do pontificado do papa Francisco. O papa, timoneiro de esperança, precisa mostrar que é capaz de transformar seus múltiplos gestos e mensagens numa nova realidade eclesial”, avalia Suess. Segundo ele, “pela idade, Francisco precisa correr contra o tempo. Seu projeto enfrenta duas travas, uma externa e outra interna”.

Paulo Suess destaca que os elementos essenciais do projeto do papa para o mundo são: a alegria, a realidade, o encontro, a missão e a misericórdia. E explica: “com o Ano Santo da Misericórdia, o papa nos lembra que o Concílio Vaticano II (1965), não é um evento pontual, mas que continua sendo um processo. A Porta Santa foi aberta para destravar o caminho conciliar. O recado é claro: ‘deixem o Concílio entrar na Igreja e saiam para as periferias em missão’”.

Na opinião do conferencista, hoje, uma das travas externas do projeto de Francisco é “o medo dos pastores”. Ele recorda que diante das resistências o papa exclama: “Não deixemos que nos roubem a força missionária e a esperança!” (cf. EG 109). E complementa: “o medo é reforçado pelo cômodo critério do tradicionalismo e pelo autoritarismo que é incapaz de ouvir os outros. O caminho sinodal deve forjar uma Igreja da escuta recíproca”.

Ao analisar as proposições do Sínodo para a Família, Paulo Suess concluiu que a inovação do evento “não está na reformulação doutrinal, mas na assunção do princípio da sinodalidade. Infelizmente, a sinodalidade, quer dizer, o princípio da participação das Igrejas locais na construção do caminho comum, só pode ter resultados a longo prazo, desde que seja também praticada na escolha dos bispos e na administração das Igrejas locais”.

Na situação atual, “o Sínodo não conseguiu destravar a contradição entre a Eucaristia ‘alimento para os fracos’ e mediadora da graça, e uma compreensão da participação na mesa eucarística que já pressupõe o estado de graça. Permanece a tarefa de repensar todos os tratados sacramentais a partir do paradigma da suprema lei da Igreja, que é o amor e a salvação da humanidade”.

Uma das dificuldades internas para fazer avançar o projeto do papa Francisco é, segundo Paulo Suess, “o espírito de colonialidade na própria Igreja”. O teólogo recorda que em seu discurso aos movimentos populares em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, dia 9 de julho de 2015, Francisco pediu perdão aos povos indígenas pelos “muitos e graves pecados contra os nativos da América, em nome de Deus”. Ao mesmo tempo, ele exalta um autoelogio eclesial de “tantos bispos, sacerdotes e leigos que pregaram e pregam a boa nova de Jesus com coragem e mansidão”. Esse descompasso entre, por um lado, o “pedido de perdão” e por outro, a “autorreferencialidade” enfraquece o discurso do papa.

Ao pedido de perdão na Bolívia, acompanhado pelo aplauso dos índios presentes no evento, segue, sob o protesto de muitos indígenas dos Estados Unidos e do México, a canonização do franciscano Frei Junípero Serra (1713-1784), no dia 23 de setembro, em Washington.

“Hoje, os índios falam de atrocidades, etnocídio e mitologia das missões, criados pelos não indígenas da elite católica regional, que propulsionou a canonização de Junípero Serra. Andrew Galvan, historiador e curador da ‘Missão Dolores’, fundada por Junípero em 1776, pergunta: ‘se eu sei o que aconteceu com os meus antepassados, como posso ser devoto de Junípero Serra?’”

Em sua exposição, padre Suess lembrou que “os povos indígenas catequizados, protegidos e colonizados pelas missões dos séculos XVI e XVII, todos desapareceram. Os índios de hoje são descendentes daqueles indígenas que não foram atingidos pelas missões”. E pergunta: “Santos como Junípero e Ancieta no Brasil estão fortalecendo as lutas dos povos indígenas ou legitimando o paternalismo e autoritarismo de seus tutores?”

“Subsidiariedade, sinodalidade, descentralização e descolonialização têm seu preço e necessitam seu tempo. O pontificado de Francisco é um sinal de destravamento de portas e de esperança”, complementa.

As atividades do Simpósio terminam nesta quinta-feita, 17, quando os participantes divulgam uma mensagem com propostas para apoiar o projeto do papa Francisco.

Fonte: POM