Missão e martírio no mundo contemporâneo

de Jaime Patias – 12/05/2011

A Basílica de São Bartolomeu, na Ilha Tiberina, no rio Tévere, que corta Roma, guarda a memória dos novos mártires contemporâneos, entre os quais, os mártires da Argélia. A Basílica reúne arquivos de 12 mil novos mártires de diversas causas no mundo.
Os missionários e missionárias da Consolata, reunidos em Roma para os capítulos gerais, das duas congregações, receberam hoje, dia 12 de maio, dom Henri Teissier, bispo francês, com cidadania argelina, que viveu todo o período da revolução cultural islâmica na Argélia, quando 19 cristãos foram martirizados, entre os quais sete monges trapistas, assassinados no dia 21 de maio de 1996, cujos corpos nunca foram encontrados. A vida da comunidade trapista de Notre Dame Ed l’Átlas, em Tibhirine, Argélia, encontra-se retratada no filme “Homens de Deus” recentemente lançado. Calcula-se que, em oito anos, pelo menos 50 mil pessoas, foram assinadas naquele país do norte da África.
Uma leitura do testamento do padre Christian de Cherge, superior da comunidade dos monges, assassinado juntamente com seis colegas, introduziu o estudo do tema “Missão e Martírio”, que destacou aspectos de fidelidade e testemunho. Dom Teissier iniciou sua colocação contando que, na perseguição, durante o discernimento sobre a permanência ou não na Argélia, padre Christian, ao ser questionado por um confrade sobre as razões do martírio, teria respondido: “O mártir não deseja nada para si próprio, nem mesmo a própria glória do martírio. Torne-se mártir por amor”. Para dom Teissier, “o filme ‘Homens de Deus’ dá a impressão de que os monges estavam lá para esperar o martírio. Essa é uma perspectiva equivocada”, disse o bispo. “Eles estavam na Argélia não para o martírio, mas para a missão”, afirmou, sublinhando mais um pensamento do padre Christian: “o diálogo com os muçulmanos é o sacramento do encontro em nome de Deus para procurar fazer a vontade de Deus e partilhar com aquele povo, Deus amor. A Ordem religiosa não tem necessidade de mártires, mas de monges em qualquer realidade onde se encontra”.
Outro aspecto destacado por dom Teissier foi a necessidade de assumir a missão com fidelidade. Os monges não estavam sozinhos, mas inseridos numa Igreja local que vivia ameaçada. Em 1993, todos os estrangeiros receberam ameaça de morte. Muitos saíram do país, mas a grande maioria permaneceu em fidelidade ao Evangelho e à missão. Entre os vários mártires, recordou-se das Irmãs Agostinianas Missionárias espanholas, Esther Paniagua e Maria Caridad Álvarez, assassinadas na Argélia, em 1997 e da Irmã Leonella Sgorbati, missionária da Consolata morta na Somália, em 2006.
Dom Teisser, terminou sua primeira intervenção lendo um trecho da carta escrita por uma mãe muçulmana, após o martírio dos sete monges.
“Depois do sacrifício vivido por vocês e por nós, depois das lágrimas e da mensagem de vida, de honra e tolerância dos nossos irmãos monges, a vós e a nós, decidi ler o testamento de Christian, aos meus filhos, porque senti que era destinado a todos nós… O testamento é mais que uma mensagem, é uma herança… O nosso dever é continuar o percurso de paz, de amor a Deus e aos homens na sua diferença. Muito obrigado à Igreja por estar no nosso meio. Obrigado a todos!”, dizia a carta.
“Isso é martírio e missão”, concluiu o bispo.

Foto: cena do filme “Dos homens e dos deuses” de Xavier Beauvois, de 2010, que trata sobre o assassinato dos monges na Argélia acontecido em 1996.